Imagens Roubadas: playlist

O título do livro, Imagens roubadas, vem de uma canção de Charles Trenet, "Que reste-t-il de nos amours?", de que um dos versos deu nome a um filme de François Truffaut, Baisers volés.

Como play list , banda sonora desta sessão de leitura-cinema pode-se ouvir, segundo uma ordem mais ou menos aleatória, os seguintes temas: 1) The Kinks, "Celluloid Heroes", 2) Elvis Prestley, "King Creole", 3) David Bowie, "I can't read" (com os Tin Machine), 4) Lou Reed , "The Heroine" (de "The Blue Mask") , 5) Eddy Mitchell, "La fille du Motel", 6)Scott Walker, "Farmer in the City" (de "Tilt"), 7) Marquis de Sade, "Conrad Veidt", 8) Bauhaus, "Bela Lugosi is dead", 9) The Clash, "The Right Profile", 10) Sonic Youth, "Tunic (Song for Karen)", 11) Madness, "Michael Caine",  11) "Science Fiction/ Double Feature" (The Rocky Horror Show), 12) The Go-Betweens, "Lee Remick", 13) The Kinks, "Oklahoma USA".

Quando se fecham as luzes e o filme arde na bobine, podemos então sair com "La Dernière Séance" de  Eddy Mitchell.


Bailey

6.30 em frente à tua porta
não sei ao certo como começou
talvez fosses madrugador por natureza
nenhum de nós faltava
nem mesmo
nos dias de chuva
caminhávamos juntos
até ao fim da rua
contavas-me como iam
as coisas no clube
a pressão da liderança
de como todos querem
algo de ti
os mais novos
são ambiciosos
estão mortinhos
por me ver fracassar
já não sou o mesmo de outros tempos

mas todos te respeitavam
até a Betsy
apesar da rivalidade
sempre suspeitei
que ela tinha
um fraquinho por ti
6.30 em frente à tua porta
vinhas ter comigo
eras um bom ouvinte
acho que estou para perder o emprego
e depois de escapar à ronda de redundancies
estou farto daquilo
acho que não fui feito para ser
animal de escritório

caminhavas ao meu lado
até ao fim da rua
exortavas
as virtudes da paciência
e voltavas para trás
ainda passo pela tua porta
todas as manhãs
já vai para um ano
que faltas
ao nosso encontro

5 poemas de Macaio Poetônio

SOB SETE PALMOS O AMOR DO PAPEL

E então
cavar os buracos que
silenciam em que humanos
engolem entram em êxtase
abraçam as paredes frias

procurar as canetas
que escrevem o sangue
pegar levantar e lamber
o moinho de onde nasce
nossa tosse.


QUANDO OS VIOLINOS RASGAM E O CORAÇÃO CAI

Cadeiras craquejam lentas –
os músicos
tristes insetos
se levantam sombras em
assombro –

gestam a escalada do ar
e a aranha faminta

cabeças pendem
para o teto corais subterrâneos
tombam sons
dentro do peito.


PROFUNDO ECO DO BERRO

: escorrer esse líquido
quente escutar a memória
prudente dos pelos o
terror dos dedos
quando o sol queima quando
o sol queima a pele
se levanta e morre,

na sua direção. Cozinheira
do querer, afia
minhas línguas lapida
meus gritos


ELOS CAMINHOS E PEDRA ONDE JAZEM A POESIA

Nenhuma flor como essa flor
que se sabe no jardim

orquídea impossível da
realidade

o poeta fumegante
essência clara viril
clichê

seu corpo casas bahia
seu tenro corpo manso seu

sem tempo fluido
coração submarino
em que rangem um ou dois poemas

existindo em perpétua e furiosa mudez.


SEM TÍTULO 2

, não importa a dança,
se a sombra estremece
essa voz de solilóquio químico

ou de rosas despedidas esses
enfeites desfeitos
nessa noite
nessas nuvens de morte


Fernando Guerreiro, Imagens Roubadas

Sobre o autor

Fernando Guerreiro é docente na Faculdade de Letras de Lisboa de cadeiras de cinema sobre o qual tem escrito, nomeadamente na revista Vértice.

Publicou os livros de ensaios: Negativos (1988), Art Campbell (1994), O Canto de Mársias (2001), Italian Shoes (2005) e, mais recentemente, Cinema El Dorado – Cinema e Modernidade (2016).

Fernando Guerreiro
Imagens roubadas
Textos sobre cinema

Enfermaria 6, Lisboa,
novembro de 2017, 146 pp.
Capa de Gustavo Domingues E StudioPilha  

12€

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O verdadeiro cinema é o que (se) passa na nossa cabeça – melhor, na parte de trás (a rádiotransmitir da morte) da nossa cabeça. Um processo alucinatório – como se diz das drogas, assistido. Daí poder-se afirmar, na senda de Epstein, que o cinema é a poesia exteriorizada, continuada por outros meios visíveis, as imagens.

Thank you, mother.

You gave me fucking Cohen.
Not the brothers the Leonard.
He was always late in December.
But I’m on Mars
and it has been lonely. It’s dry and arid,
like a Christmas flooding.

That’s why you made me a poet
as you said, for art’s sake,
and it does look like art.
But I see you, mother,
it is not all about being present.
It is about being absent.

In absence,
you can always say you were here,
that poets tend to be alike.
But verses are made of wood,
and like wood is solid, detailed,
so dawn has its darkness.

But, mother, thank you mother,
don’t look at me, you know,
woes are without comfort.
That’s why they do smile,
believe me, they do smile
like aged teen spirit.

(To Tatiana Faia)