(a física da meta)

Os pulmões estão como
sempre dentro do corpo
e de olhos fechados tento
virar para fora o que é de fora
e ser em imagem a espessura exacta
até aos pulmões
não pela via natural, a da
comunicação vital, a que respira
mas por uma imagem infrapossível que
corte as camadas e a amnésia
sem as ferir
meio cheios
indolores
ignorantes e funcionais
com tudo para viver, estes pulmões
ignoram os dedos na testa e
a dor dos nós nos dedos
fazendo-se impressos

não tenho palavras, chegaram ao fim

o manto das alergias cobre-me a cabeça
empurra-me o peso para baixo
com a boca aberta
estou inchada e o nariz entupido
o que entra e sai
segue uma lógica para a qual
estou adormecida
com as leis ao longe
à distância demandam e acenam
e eu encruzilhada
espero que os pólens assentem, que o
acaso se faça, que a
acção me escolha
espero que o tempo passe
sustenho a respiração que ignora
quem passa por quem
eu por ele ou ele
por mim

páro o tempo nos sacos espalhados na sala
dedico-o à voracidade das palavras engolidas
observo a arena contida em que se enlaçam descompassadas a
vocação contemplativa e a
fome desmesurada de concretudes
indago o necessário para morder
e o modo de ser comida
pela realidade
pelo destrinçamento de um nó
por uma filosofia mais física
construo pelo abandono uma
memória e pasmo de
tocar, cheia de minúcias preenchedoras e
abstracções com que romper a
casa contraditória
saio, deixo os líquenes a
crescer nos sofás
o quarto a reflorestar-se sem mim

a casa é o tempo que não me inclui

não saí, supus-me saída e
com surpresa dói-me a nuca contra
o esqueleto pobre do sofá, contra
o braço em madeira encostado ao
canto, o sobrevivente
tolhida estalo para um lado e para o outro o
lembrete articulado de onde estou
sobre o pescoço e depois os pés
o que rodeia os ossos está mole
o que rodeia a mole está passado
e impassível
apodrecimento, fim, cultura, início
um ciclo da vida
acontece nos pratos e cantos 
o ar que medita mundano entra e sai
a força que engendra trágica
depende da vontade
talvez minha
ou de quem lê