Le Déjeuner sur l’Herbe

Conheço o ritual. As famílias fundem-se nas vértebras dos domingos inesgotáveis, regressam às árvores, estendem as suas toalhas, trazem um cesto cheio de munições. As crianças encontram no chão a proximidade ao longe. Correm com a solidão de fora. Estão extremamente descalças. Brincam com a probabilidade eufórica do monstro. A sua motivação é desoladora. Os adultos inquietam-se. Trocam migalhas, saudações. Os homens sonham com Victorine Muerent, a famigerada musa de Manet, e pedem às suas senhoras uma imitação consoladora. As mulheres despem-se, contrariadas e celestes, sobre um fundo pálido de floresta e naturezas mortas. Abrem-se os cestos, descobrem-se os gostos. As frutas a céu aberto, as carnes temperadas pelo pequeno desassossego da moda, os insectos que pousam sobre a massa branca e perfumada do abandono, numa óbvia incitação à fenomenologia dos odores. As crianças crescem na distância e correm para sempre na inescrutável direcção do Sena e dos seus afluentes e assombros. Os homens continuam vestidos de morte e de forma absolutamente mental atacam as suas senhoras. É o auge da refeição. Cai uma espécie de noite que a mastigação ilumina por dentro e o vinho prolonga. As crianças regressam do rio. Não entendem a imobilidade canibal dos progenitores, a forma como a nudez das duas mulheres se consome, pouco a pouco. Farejam os restos que escorrem dos cestos. Trepam às árvores. Aconchegam nas armas a dureza das munições. E apontam.