Francisca Bartilotti

Aos 10 anos, escrevi um livro de quadras muito rimadas e apropriadas à idade (mar/ar; pão/coração). No seu prefácio, a minha mãe contava que, quando nasci, não chorei: abri muito bem os olhos e olhei à minha volta fixamente, como que absorvendo tudo. Nessas quadras, transformava em rima as minhas dúvidas e inquietações. Começavam habitualmente por uma questão repetida: O mar? O Que é o Mar? A Terra? O que é a Terra? A vida, o que é a vida?/ Será um acontecimento/Desde uma barriga/Onde foi meu nascimento?/Será que nunca acaba/Será que há outros céus?/Onde se voa sem asa/Onde se vai ter com deus?

O assunto da minha escrita não variou muito desde essa fase. Saí dos moldes da quadra e entrei no molde do meu pensamento. Escrevo como penso. Os temas continuam a surgir de olhar para o mundo fixamente. Começaram a surgir também de olhar para mim fixamente, tentando perceber o que sou, questionando-me continuamente.

Galeano conta que, em turco, as palavras caminhar e coração têm a mesma raiz. Também em mim, caminhar e coração têm a mesma raiz.