beco

tréguas nenhumas
ao que fazemos deixamos de fazer
pois tudo se entende vão 
como parece no mero
engenho planeado de querer
prontificar a redoma bonita 
intacta para apreciação
em justa
medida justamente
sem razão pra existir
e depois ainda a sentençazinha 
com ares de sapiência 
máxima de quem viveu
antes de nós

hoje 
qualquer
porta se fecha
assim sem janela 
que valha uma aberta que seja
eis o imbróglio destes dias
a espada face à parede
a aflição em apneia lá metida pelo meio
e resquícios estilhaçados da dignidade:
o disfarce a caraça do sorriso
sempre na urgência de esconder
como se um prego forte sobre a maré cheia
pudesse fixar a fundo essa humanidade

Terena

de azul e amarelo
riscam-se caiadas
as casas honestas
sob o sol alentejano

reverbera branco o calor 
abafo de luz onde rebrilha 
a cegueira curva
xisto coberto pela mole temperatura
das horas que desconfiam 
em vago ócio consumado

sobrolho franzido 
fixo
e outros esgares esquivos
não é amistoso 
o rosto agreste de quem ocupa
as paredes raianas 
destes lugarejos
parcos de forasteiros

rebuscada e fina

rebuscada e fina
brilha barroca a filigrana
que pende em ouro
sobre o peito cheio 
do arfar forte
suspirante
depois da ladeira acima

uma gota suada
cansada escorre
pinga abaixo pelo colo
em esforço
da braseira mais pesada
a mão em riste bruta 
e farta arrepanha a pele
amparando assim a pausa
antes do próximo passo 
lento até à fonte


O perfil de Leonor Buescu pode ser consultado aqui.