Otro día... (poemas sintéticos)

En 1919 José Juan Tablada publicó Un día… (poemas sintéticos)1 , una alabanza a la naturaleza compuesta de haikus y estampas circulares diseñadas por él mismo. Decidí reescribir sus poemas para imaginar un día distinto, casi un siglo después, en el que más que una oda, lo urgente es reflexionar sobre la inminencia de una catástrofe ecológica. También sustituí sus dibujos por las fotografías que se mandaron al espacio en el Disco de oro en 1977 (una de las pocas pruebas de la vida en la Tierra que sobrevivirá cuando hayamos desaparecido). Estas imágenes están intervenidas con acetona para emular los trazos originales Tablada y, al mismo tiempo, emborronar la memoria que contienen.

Impresión mecanográfica, fotografía y acetona
16 x 22.5 cm c/u (38)
2017

Dois poemas de Juan Carlos de León

SE ABRE EL PARÉNTESIS:

el poema aflora y sangra
      sangra
(( crece ))
      y nuevamente
      sangra
al punto que
la uva
puede traducirnos el lenguaje
de la vid


REDENCIÓN

El pez
dispone su boca
al silencio 

filamentos de tiempo como arcos
resumen la curvatura de la vida

resonancia en círculos
voces y encanto 

Ha quedado mudo el río

Por la mañana
las mujeres
desnudan su carne redentora 


Eclipse

Augusto Monterroso
(Obras Completas y Otros Cuentos, 1959)
Tradução de Patrícia Lino

Quando frei Bartolomé Arrazola se sentiu perdido aceitou que já nada poderia salvá-lo. A selva poderosa de Guatemala tinha-o apressado, implacável e definitiva. Perante a sua ignorância topográfica, sentou-se com tranquilidade à espera da morte. Quis morrer ali, sem nenhuma esperança, isolado, com o pensamento posto numa Espanha distante, particularmente no convento dos Abrojos, onde Carlos Quinto consentira uma vez descer da sua eminência para dizer-lhe que confiava no zelo religioso do seu labor redentor.

Ao acordar deu por si rodeado por um grupo de indígenas de rosto impassível que se dispunham a sacrificá-lo em frente de um altar, um altar que a Bartolomé pareceu o leito em que descansaria, por fim, dos seus temores, do seu destino, de si mesmo.

Três anos no país tinham-lhe conferido um domínio mediano das línguas nativas. Tentou algo. Disse algumas palavras que foram compreendidas.

Floresceu então nele uma ideia que tinha em conta o seu talento e a sua cultura universal e o seu árduo conhecimento de Aristóteles. Recordou que para esse dia se esperava um eclipse total do sol. E decidiu, no seu mais íntimo, valer-se daquele conhecimento para enganar os seus opressores e salvar a vida.

— Se me matais — disse-lhes — posso fazer com que o sol escureça na sua altura.

Os indígenas olharam para ele fixamente e a Bartolomé surpreendeu a incredulidade nos seus olhos. Viu que formaram um pequeno conselho, e esperou confiante, não sem um certo desdém.

Duas horas depois o coração de frei Bartolomé Arrazola vertia o seu sangue veemente sobre a pedra dos sacrifícios (brilhante debaixo da opaca luz de um sol eclipsado), enquanto um dos indígenas recitava sem nenhuma inflexão de voz, sem pressa, uma por uma, as infinitas datas em que aconteceriam eclipses solares e lunares, que os astrónomos da comunidade maia tinham previsto e anotado nos seus códices sem a valiosa ajuda de Aristóteles.