O que é preciso é estrutura

Lamento que ainda haja em Portugal categorias profissionais não enfileiradas em Ordens. Assim como as temos para médicos, advogados e enfermeiros, não vejo o porquê de auxiliares educativos, agentes dos serviços secretos, tuk-tukeiros e aquelas-senhoras-sempre-simpáticas-no-atendimento-dos-centros-de-saúde não regularem sozinhos a sua carreira, fechados sobre si mesmos e com um perfumado discurso de interesse geral, como deve ser.

Os profissionais das artes, por exemplo, também teriam muito a beneficiar se a SPA se tornasse uma Ordem dos Autores, com exames de admissão, numerus clausus, umas instalações de impor respeito e financiamento estatal sim senhor. Só não podiam era chamar-lhe OA, que levariam com o megafone do senhor eurodeputado-até-ver-e-em-part-time Marinho Pinto das 9h30 às 17h30, ressalvando a necessária pausa de 1h30 para almoço – deles e de Marinho Pinto, que aquele abdómen não se faz aos gritos.

Mas teria sido tudo grandioso: no PREC não haveria quem publicasse o que Barata-Moura e Saramago, os homens ao leme, não considerassem suficientemente respeitador dos operários da SPAL; seguir-se-ia a contra-revolução por Vasco Graça Moura, secundado pela consultora Agustina Bessa-Luís; e assim sucessivamente em alinhamentos e realinhamentos, resumiria o clandestino João César Monteiro, até que ao escândalo da liderança de Tomás Taveira se seguissem Bastonários sem pescoço, um dos quais João Tordo, que atribuiria bolsas de licença sabática a todos os recém-licenciados artistas com média superior a 11. Mas o ramalhete não ficaria completo sem o fugaz reinado do verdadeiro artista Artur Baptista da Silva, e mais recentemente o lusófono pastel encabeçado por um naturalizado Anselmo Ralph, promotor em verso de relações impossíveis, que envolvem até a partilha do PIN do e-mail (ó ouçam a Não me toca).

Mas porquê numerus clausus, se uma estrutura profissional que se preze é tão mais bonita quantas menos mediocridades exclui? Há que ser democrático, venham daí os artistas e os artolas, provenham ou não de famílias raçadas e tenham maior ou menor pedigree académico. Uma OA a sério, e com verdadeiro poder, para defender o interesse público, naturalmente, teria muito a aprender com um tipo peculiar de “Ordem”: a dos políticos, mais conhecida como democracia representativa por quem consegue distanciar-se do cheiro.

Para dar um exemplo da política, um qualquer Duarte Marques das artes, isto é, um José Luís Peixoto ou um valter hugo mãe, ascenderia inevitavelmente ao topo da AO, está escrito nas estrelas. Bastaria que apelasse ao voto das facções livreiras da auto-ajuda e da Chiado Editora, poderosíssimas na AO: dar-lhes-ia conta da sua total impotência no acto de parir romances brilhantes e entrevistas de recortar para a memória, a dele, claro, inoculado talvez pelo Espírito Santo, ou talvez por espíritos, dependendo do interlocutor. Semelhante mensagem atrairia certamente “artistas” de outros ramos com semelhante peso na estrutura: o sentimento seria partilhado pelos membros de todas estas facções, e o país seria claramente melhor por de algumas cabeças pensantes, sobretudo destas, depender a actividade artística. 

Se esta utopia enche o coração, ai se enche, é porque compreendemos o efeito social das “Ordens” políticas, de cujas cúpulas depende muito mais. Não tanto quanto poderia depender, ainda assim, porque em Portugal há a chatice de haver mais do que um partido e alternação no poder, facto que, até novas ordens, vem implicando a aborrecida impressão de boletins de voto e a contagem das pilinhas lá desenhadas. Tenho a certeza de que esta segmentação da representação política em mais do que uma “Ordem” limita o potencial da democracia (no sentido de governo do demo), na medida em que os danos infligidos sobre a sociedade por um partido único encabeçado por imbecis são de uma magnitude invejável, não comparável com o prejuízo causado por vários partidos liderados por pessoas quadradas que, para além do seu umbigo, devem satisfazer os interesses de quem neles vota. Seria tão melhor poderem pensar menos em nós.

Para comparar, nem é preciso considerar regimes não democráticos. Na África do Sul, onde um só partido vem governando desde que Nelson Mandela o quis pela primeira vez, e foi continuando a querer, o funeral em que lhe agradeceram o serviço à humanidade, em nome dos decentes de nós, foi marcado por um acto de idiotia corajosa de um tipo que exemplifica o potencial das juventudes partidárias. Thamsanqa Jantjie, assim se chama, foi o intérprete de língua gestual que traduziu, entre outros, o discurso de Obama para um misto de sinais inexistentes e outros, inadvertidos, como cadeira de baloiço e camarão, adequadíssimos ao contexto. Jantjie ainda se disse vítima de um ataque esquizofrénico, mas descobriram-lhe filiação na jotinha da ANC, que, vá-se lá saber por que noção de serviço público, o contratou, a ele que nem formação tinha, funcionário da SA Interpreters, entretanto extinta, empresa não registada na associação nacional de intérpretes e tradutores.

Competentemente, a Ministra das Mulheres, das Crianças e das Pessoas com Deficiência (por esta ordem, como se vê), foi lesta a considerar que os detractores de Jantjie não tinham o direito de lhe chamar fake, coisa que até o próprio fez parcialmente, dizendo-se vítima da sua esquizofrenia, mas ao mesmo tempo designando-se “campeão da linguagem gestual” (cadeiras de baloiço é de mestre). Jantjie foi hospitalizado e alvo de um inquérito interno do ANC, não do Estado, saliente-se, do qual como é natural nada resultou, e a imprensa descobriu-lhe um processo em tribunal por fraude (no valor de 1,5 milhões de rands), um episódio caricato em que fez um oficial refém em tribunal, e duas tentativas de entrar na universidade com falsas credenciais, depois de ter abandonado o ensino na escola primária. Não há Miguel Relvas nem José Sócrates que batam isto.

Nem eles nem Artur Baptista da Silva. Jantjie é o exemplo acabado do tipo de party-made man que uma democracia, qualquer democracia, produz, mas as consequências para o que fez, que foram e serão absolutamente nenhuma, são típicas de uma democracia em degenerescência – como acontece a quase todas poucas gerações após a sua fundação, ou mesmo desde a sua fundação. E ele feliz da vida:

Eu, bem longe do cheiro, também.

Ampliação do campo de batalha

Para que algo seja verdade terá de existir uma quantidade suficiente de repetições. Depois de vários meses a acordar sem despertador cheguei à conclusão de que a juventude ficava definitivamente para trás. Precisava de menos horas de sono. Ou talvez me tenha começado a deitar mais cedo. Foi por volta dessa dilatada tomada de consciência que me apanharam. Traí as minhas próprias normas. Quando trabalhava bem e me sentia totalmente confiante o negócio corria às mil maravilhas. Houve vezes que nem contada estava uma hora e os meus benfeitores já riam selvaticamente comigo. Hoje em dia a boa aparência e a astúcia aliadas a uma preparação suficiente é tudo o que é necessário. Umas semanas de trabalho chegavam. Conseguia o suficiente para viver durante alguns meses sem olhar a gastos. Desaparecia. Viajava, aprendia línguas, visitava museus, conhecia monumentos. Não repetia destinos. Através da internet contratava as melhores prostitutas porque é nesse campo que a internet continua a ser mais útil. Algumas anunciam possuir uma série de cursos. O que conseguem é fazer teatro o tempo todo; na representação são habilíssimas. Fazem teatro mas não enganam ninguém. Fazem ensaios com a verdade e as mais profissionais estão dotadas de uma imaginação notável. Se não tens imaginação a ideia de realidade/verdade é a única a que te podes agarrar. Enfim, uma classe um tanto desconsiderada mas com meias de liga de reposição na mala. Outras vezes nos hotéis conhecia alguma mulher sozinha. Não era muito diferente de burlar um desses empresários a quem a própria ambição traía. Conquistar o afecto dessas mulheres independentes, cultas, angustiadas mas secretamente disponíveis para serem iludidas, uma boa maneira de manter a forma entre um arruinado e outro.

Comecei a perder a paciência, paradoxalmente talvez tenha entrado numa espécie de rotina. Alguns clientes exigiam muito esforço até caírem no meu conto. Tentava perceber se perdia tempo com algum agoirento sem a mais pequena expectativa de crescimento, para já não falar em confiança, lesmas nervosas. Mas ao mesmo tempo não me dava por vencido, uma espécie de orgulho inútil. A paciência não foi uma virtude com que a existência me prendou. Denunciaram-me. Dei às de Vila-Diogo mas aguentei até à última e já era tarde para uma fuga bem sucedida. Não confio na sorte. Quando actuo procuro ter o ambiente controlado e a maioria das contingências previstas. Não sou um amador. Vigiei um conhecido empresário que por não se saber comportar e por se meter com vaidosos do pior género já tinha sido várias vezes notícia por supostos escândalos financeiros. Fiz um pequeno investimento e facilmente ganhei a sua confiança. Tentei extorquir-lhe directamente dinheiro, com violência física e muitas ameaças, coisa que até aí nunca me tinha passado pela cabeça. A coisa correu mal e a polícia foi avisada. A polícia. Passam as passas do Algarve para conseguir uma renovação da farda ou uma arma que não tenha ferrugem mas cumprem a sua missão de modo exemplar. Tentei provocá-los ao máximo para que me dessem um bom ensaio de porrada que depois pudesse denunciar; mas os grandes filhos da puta mantiveram-se firmes naquela dignidade pacóvia que sobretudo não arrisca uma suspensão; quebrar um pouco as regras podia querer dizer deixar os filhos de estômago vazio. Sentia verdadeira pena dos agentes que me algemaram. Na verdade, eles não tinham culpa de nada. Conseguiram um emprego fixo e isso para eles significava atingir o grau mais alto na escala das necessidades satisfeitas.

Foi a primeira vez que me apanharam. A primeira e a última. Aprendo com os erros. Não tinha antecedentes e consegui dar-lhes a volta. O advogado era um novato e instruí-o na estratégia a seguir. Foi como fechar um negócio, assinar um contrato de serviços inexistente. Embora a recompensa fosse a minha liberdade e não uns valentes cobres. Agora tenho de calcular todos os meus actos e vigiar-me. Não posso voltar a errar. Não me vejo fechado numa cela, com saídas ao pátio ordenadas por gente que acredita, que pensa que me desviei do caminho mas que estou sempre a tempo de voltar à vereda que eles trilham a passo de boi; o que mais aprecio, quando estou em algum hotel longe das cidades, é acordar antes do nascer do sol e sair de madrugada para aspirar o cheiro da noite sabendo que ainda me restam dias e dias de gozo antes da golpada seguinte; recordando, rindo entre dentes, essa vivacidade modesta das pessoas que vivem do trabalho razoável e não quiseram ou tiveram coragem para alargar o campo de batalha ao batimento cardíaco desesperado, sentir o percurso do sangue nas veias, as voltas vertiginosas cada vez que é bombeado, e é só assim que me sinto vivo e eles estão todos mortos, mais mortos que uma perna de borrego.

Martin Amis e a literatura

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Martin Amis, León Espanha, 2007. CC BY-SA 2.0 voorwaarden bekijken

Parto da entrevista de Martin Amis ao philosophie magazine, 24/04/2014, para pensar a literatura, o que é (eterna questão) e para que serve (pergunta que se manterá enquanto não se responder à primeira).

Sabemo-lo, Martin Amis, um dos muitos escritores da extraordinária literatura realista inglesa, é capaz de descrever sem contemplações os lados mais obscuros da humanidade, dissecando simultaneamente o individual e o social, com um rigor que não recusa o excessivo e o iconoclasta, num tom rude mas refinado. Como se espera de alguém filho do romancista Kingsley Amis (Sir em 1990, por serviços prestados à literatura, achava a escrita do filho sexomaníaca e um pouco grosseira; o filho preferia Vladimir Nabokov) e estudante em Oxford. Com os livros Dead Babies, Success e Money (1975, 78 e 84 respectivamente) impõe-se pela criatividade estilística, o poder descrito de uma veracidade atordoante e uma feroz crítica social. Ataca a partir de ângulos inabituais o mundo obcecado pelo dinheiro, o consumismo desenfreado, o individualismo niilista e a sexualidade viciosa. Sem ser miserabilista, as classes desfavorecidas não são impolutas, Martin Amis descreve e prescreve, antecipa o “espírito do tempo”, por isso previu na década de 70 como nos iríamos alienar num consumismo descontrolado, amoral e inestético, onde até a alta cultura foi abraçada, num beijo de morte ainda por reconhecer, pela indústria capitalista.

[a literatura como analítica da actualidade, mais poderosa do que o jornalismo ou as ciências humanas, mais também do que a sempre-eterna filosofia, durante muito tempo rainha da crítica. A prestidigitação literária, ou porque antecipa ou por produz profecias auto-realizadas]

Amis escreve os primeiros romances na ressaca do hedonismo hippie, essa extraordinária e arrebatada libertação moral e sexual. Mas Amis viu também na revolução uma face obscura, uma espécie de “carnaval negro”, exemplificado na morte da mulher de Roman Polanski por Charles Manson. Por outro lado, a alteração abrupta dos valores e comportamentos sexuais criou uma “imensa tensão” entre filhos e pais, estes não souberam transitar da repressão sexual em que tinham vivido para o campo de prazer livre da juventude. Assim, a revolução desenvolveu também desequilíbrios e ressentimentos.

[um bom analista sabe que a linha de interpretação dominante esquece muitas pontas soltas. Amis lançou-se à descoberta das sombras negras que estão para lá da cortina de luz das épocas sagradas da história. David Lynch faz isso no cinema em relação a fragmentos “perfeitos” da realidade, gosta de esgravatar à procura da anormalidade. Eterno retorno do semelhante de Alice’s Adventures in Wonderland, mais uma variação do fascínio pelos subterrâneos da humanidade]

Money. A Suicide Note, de 1984 – a página web da Amazon.com, na Editorial Reviews, qualifica-o de “Absolutely one of the funniest, smartest, meanest books I know” – põe em cena um capitalismo integral, um homem unicamente movido pelo dinheiro. Para Amis, John Self, personagem central de Money, representa o paroxismo do individualismo e da obsessão materialista numa sociedade que emergiu em 1973. Sem esconder alguma ingenuidade, Amis acredita que até àquela data era fácil adoptar uma vida boémia, viver com cerca de 10 Shillings por semana. Este lifestyle, económico e experimentalista, desenvolveu as avant-gardes, as revistas literárias e as humanidades. Quando pouco depois começou a ser necessário ganhar 10 vezes para sobreviver, tudo isso desapareceu, tinha chegado a “sociedade do dinheiro”.  Claro que esta sociedade, sabemo-lo todos, é suicidária, faz muitos émulos de John Self, vivendo para consumir bens socialmente relevantes, objectos que se apresentam como de luxo. Excepto numa coisa, John, como os discípulos, ama a comida barata, porque é “mais rica em gordura e açúcar”.

[a Amazon julga saber o que leio a partir das minhas pesquisas. Por isso me aconselha paternalmente coisas semelhantes, fabricando uma teia semiótica à volta do meu presumido gosto e necessidades. A “sociedade do dinheiro” destruiu muitos modos de vida, mas talvez os criativos, os divergentes que sabem manejar a caneta devessem ter resistido, mantido a frugalidade de um dia-a-dia alimentado mais por ideias do que por objectos. Tenho amigos da esquerda política mais pura que andam de laptops Apple, articulam facilmente Marx com Steve Jobs ou Mao com um iPhone. Eu próprio, que sem ir à missa também me considero de esquerda (tenho preocupações que não acabam no meu umbigo e preocupo-me mais com os dominados do que com os dominantes), escrevo este texto num iMac. E se no meio de todas estas contradições o suicídio não fosse, como tantos vaticinam, uma linha de decadência? Se pudéssemos ver como são festivos os comportamentos autofágicos que desfazem a parte da humanidade que sublimou todo o imaterial (evito, por razões de clareza, o “espiritual”) no material?]

Quanto ao declínio do Ocidente, o último romance, Lionel Asbo: State of England, parece ser um fresco sobre uma Europa doente. “Parece”, porque Amis assegura que à medida que envelhece mais se convence que a literatura tem as suas raízes em coisas positivas. Não se pode escrever um romance, diz, em modo colérico. É preciso afeição e amor para escrever. Mesmo as personagens pícaras são construídas com ternura, sente amor por John ou Lionel. Este, aliás, subestima-se ao julgar que é estúpido. Amis acredita que há enormes reservas de inteligência nas classes populares (a que Lionel pertence). A inteligência tem pouco que ver com a instrução, ela é irredutivelmente democrática, e não um privilégio de classe, emerge sempre como uma força bruta pouco influenciada pela educação. Mas estes personagens, os livros que escreve para denunciar as sombras menos visíveis da humanidade, não querem mudar nada ao statu quo ante. Além de The Satanic Verses e de Daniel Deronda de George Eliot (facadas na ética vitoriana), poucos são os romances que têm algum efeito na sociedade. Apesar disso, um escritor deve escrever sobre a realidade, “cada vez que se conta um sonho perde-se um leitor” (os sonhos são demasiado pessoais). O romance deve apanhar o universal, é essa a grande herança do pai, que demorou décadas a compreender.

[amar incondicionalmente os personagens, todos eles fruto de uma erótica maior. Só se pode escrever bem quando sentimos em cada linha, mesmo nas diabólicas, a presença, discreta, de uma centelha de luz resistindo aos sopros mortíferos. A literatura é mais uma forma de fazer realidade, também ela tece a manta de retalhos do mundo tangível. Acrescenta ou muda muito? Altera e cria para lá da quantidade, é uma arte muito reservada, secreta quase, de produzir vida e sentido. Mas nas dobras da história, quando a humanidade muda de caminho, aí está o seu esplendor. Quanto aos sonhos, o onírico pode ser bem mais universal do que o raciocínio lógico-analítico. Creio, aliás, que somos todos filhos de sonhos]

Sexta Conjugação, 6

Não sabiam sequer que navegavam
por mais mar que houvesse.
Para eles a água não tinha terra
como quando aprenderam a ter sonhos
e a calar o que aprenderam.
Numa parte deles nasceram âncoras
que os fizeram por pouco tempo pescadores,
chamando redes à sua prisão de cais.
Outros foram morrendo afogados
à procura de terem de respirar.
Outrora não havia rios nem ventos
e os vulcões faziam falésias no gelo,
e os roncos dos meninos adormecidos
mimavam as luas que se formavam.
O tempo de uma esquisita chuva
que se vertia como um pássaro
e sibilava como uma áspide.
Tomavam o seu veneno de madrugada -
se soubessem onde estava o norte -
e já quase doentes comiam o que havia.
Quem nasceria primeiro, que ruína
faria templos na memória deles?
De quem há eco só a poesia
guarda o pouco que se perdeu,
aquele nada de milhões de pensamentos
que faz uma espécie ter música
e nascer para navegar.