Falstaff e o riso

Ou porque xis ou por que ípsilon,
os sentimentos muito direitinhos,
muito bem vestidos
com os seus andrajos de filme.
E as lágrimas a cair entre entradas e saídas.
 
A noite toda promessas, num esvair de passes e fintas,
porque porque há uma indústria
e a lista dura um dia.
Com tudo aquilo que é imprescindível
(e cada época tem a sua).
 
Ai como eu queria as filas da frente.
Ai como eu queria estrelas e requinte.
Ai como sou inteligente.
Ai como persistem os sonhos, as fantasias.
E como toda a ciência parece inútil.

Adolf Schrödter - Falstaff e o pagem, 1867.jpg

Adolf Schrödter - “Falstaff e o pagem”, 1867.

Perder, imitar e prosseguir,
de rancor em rancor,
pelos nós do agora.
O medo tanto, cada vez maior.
É tão fácil perecer,
enquanto o sono, as insónias.
 
De devaneio por fome,
de gula por fantasia, cais de joelhos,
Ah a flor das árvores altas.
As pequenas grandes obras,
a engenharia,
os rastos pegajosos.
 
Os olhos caem-te no lençol
e ficas, nuvens baixas,
pelo arquivo das derrotas.
Chove.
Tantos charcos.
Incógnitas.

Charles Ray - The New Beetle, 2006.jpg

Charles Ray - The New Beetle, 2006.

Património

Migalhas muitas e folhas e restos
e periscas que inundam passeios
e caminhos. Palavras assim,
ao abandono, perdidas.
Que não inquietam ninguém,
excepto os doentes
que tudo sentem de modo mais vívido.
Tudo tão volátil
como os textos e imagens
que ficam pelos arquivos
digitais ou físicos, ensimesmados
nas metáforas da selva e do circo.
Isso que, para os mais velhos,
é ainda pura monocromia.
De facto, que seria dos museus
sem estes desperdícios?

Obelisco do Alto da Memória, Angra do Heroísmo. (Pormenor).