Os pedaços de Simon

Simon (Brady Corbet) é um americano acabado de sair da universidade que, tendo sido abandonado pela namorada, viaja para Paris de modo a superar o desgosto amoroso. Precisa de esquecer a mulher. Sucede que em Nova Iorque, Londres ou Paris, a nossa cabeça é a mesma. Os fantasmas e fantasias acompanham-nos para todo o lado. Simon vê mulheres novas e bonitas mas não esquece a mulher que o deixou. Além disso, não sabe interagir com outras mulheres, faz má figura. Olha para duas parisienses e, qual marciano, persegue-as, faz-lhes perguntas descabidas, entra com elas no metro e, como não sabe dialogar como um terráqueo, segue viagem sozinho. 

O realizador americano Antonio Campos consegue em Simon Killer (2012) contar brilhantemente a história de um rapaz perturbado, auto-centrado, incapaz de gerar empatia. Simon conhece uma prostituta chamada Marianne (Constance Rousseau). Ela diz-lhe que ter sexo com ele será um real prazer, uma vez que todos os seus clientes são mais feios e velhos. Simon acredita e envolve-se, não se apaixona, que Simon nunca se apaixona. Ele sofre pela ex-namorada, liga-lhe incessantes vezes sem que seja atendido, mas não revela qualquer sentimento, antes obsessão, a mesma obsessão que o liga à prostituta. Estamos na presença de um narcisista que (só) chora por si mesmo. Campos apresenta os eventos a partir de fragmentos. O que temos é o olhar claustrofóbico de Simon. Não vemos as cabeças das pessoas mas um ombro, um pedaço da nuca, uma perna. Recortes. Um recorte da prostituta no chão. Uma perna coberta por uma liga preta e uns ténis converse a seu lado pertencentes a um homem aparentemente apático, submerso nos seus pensamentos sobre si mesmo.

Simon começa a viver com a prostituta. Não há amor. Repita-se. Amor não é obsessão. Em dado momento, Simon convence a prostituta a chantagear alguns dos seus mais ricos clientes, filmando-os enquanto fornicam. Não sabemos quais as motivações do par. Talvez uma forma de ganhar dinheiro. Uma forma de ir abandonando a prostituição. Simon só convence a prostituta a fazer algo do género por não sentir nada por ela e por ela já não saber amar como uma rapariga da sua idade deveria amar. O plano corre mal. Marianne é espancada. Simon vira-se para uma bonita francesa ao mesmo tempo que deixa a prostituta em casa, curando-se sozinha do espancamento. Também Simon acaba por espancar a prostituta quando se farta dela, quando ela já não lhe serve. Bate-lhe tão violentamente que se fica com a sensação (mas sem a certeza) de que a moça morreu. Simon acha que a matou e liga desesperadamente para a mãe e chora, chora, chora, parece uma criança arrependida, uma criança não verdadeiramente arrependida, desejosa de se livrar de qualquer condenação. Mãe, livra-me disto. 

Simon é um assassino, um canalha e um cobarde e nada de bom sentimos por ele. Não é daqueles anti-heróis que suscitam a admiração do espectador. O seu mundo é amoral e retalhado. Não o vemos procurar a salvação ou a cura para os seus desgostos amorosos. Simon é alguém que só consegue ser doente, obcecado, não existe bem nem mal no seu mundo, só patologia, pedaços de espelho espalhados por Paris, umas nádegas, duas mulheres perdidas na noite, um bordel qualquer, uma ex-namorada sem cara e sem voz. Uma espécie de incomunicabilidade. Simon é incomunicável. Fala para dentro, pensa para dentro. Nem o espectador sabe o que pensa. O realizador está de parabéns, criou um psicopata e fez-nos sentir repugnância ou desprezo pela personagem.