Três Poemas de Ismar Tirelli Neto

Eu caminhava           ponto

Não cismava na mecânica da coisa
Nem ela
Cismava em mim 

Sujeito mais encontradiço
Não havia não

Esmolava circunstância
Dizia condescenderei em tudo 

Dirão "cidade"
Não objetarei "cidade" 

Sujeito menos obstante
Não haverá

Ficarei como pede a prudência
Pelas praças virguladas 

Logrado um lugar
Nos apropósitos  

Todos, no erro
Em que laboro 

Laboramos todos 

*

 

Um desditoso

Tenho desditas
Não pretendo me alongar no assunto
Gostaria de cravá-lo em alguma parte
Esta grandeza
Ter desditas
Já ninguém parece tê-las
Eu as tenho
Uma soldadesca
Tenho desditas no corpo nos corpos
Onde fui me lavar
Na alma de cardos desditas
As que a mim inerem
As que venho
Como Jó
Recolhendo
Quem vem lá
Um desditoso
Eis o que sou
Um desventurado

Já ninguém é
Já ninguém tem desventuras
Já ninguém tem antigualhas assim
Sobre a credência
Pois eu tenho
Cirando em torno delas
Passos escusatórios
Lâmpadas acesas a meio da tarde
A noite que cai as portas com ela
E este sorriso que cairá
Um por um
cairá
São
As desditas
Não, não pretendo me alongar no assunto
À minha maneira
Devo ser um homem feliz
Que tem cirandas
Estas cirandas
Quem não seria feliz
Com estas cirandas de cardos
Tendo uma alma de cardos? 

*

 

Eis o nosso novo hóspede

o mar
pôs longa mesa de cedro no fundo do mar
cobriu-a de pregos
sal negro
prataria saqueada aos naufrágios
postados diante dos pratos
dos cartões
diante dos pratos
relutamos reconhecer os nossos nomes
queríamos
- aqui trocamos olhares
viscosos azuis -
moer todo o turismo
descasar chave
fechadura
voltar voltar
era impossível
entredissemos
azuis
não resistiremos muito tempo
tentamos emitir
alguma espécie de sinal
que desse a entender
ao nosso hóspede
que não resistiríamos muito tempo
não resistimos muito tempo
estávamos famintos
estávamos azuis 


[Perfil de Ismar Tirelli Neto na Enfermaria 6]