Templo, Córregos, Banquete, Você me enche de areia, Futuro em fúria, Playground, Estadia

TEMPLO 


nunca intacto
repouso nesta superfície de cascalhos
sonhos aprendidos ao hálito da terra

lágrima primata incrustada na labareda
planície viva do princípio
tarde marmórea por onde encontro
suas coxas quentes
secretamente solares



CÓRREGOS


bota imersa na
flora do destino
brilho transatlântico
fincado em alma

auroras e cachos
moto infinita na neblina

dilúvio de nuances
improvisando verões

o jazz campestre na barraca da noite
desfigurava também o interior de nossos pulsos


BANQUETE


estirados sobre uvas e fogueiras
oferendados aos olhos do dragão
adormecidos em tambores e maços
devorados na miragem nupcial da ordem

as fábricas nas unhas crescem



VOCÊ ME ENCHE DE AREIA


gargalhada nua e seca
me atrevo na pulsação réptil
e a imobilidade da árvore fascina a fome inexata 

dois meses desfizeram meu herói amador agora vivo em conchas
pirâmides se entulham em meus pulmões
    sou um golpe cinza numa guerra sem mira entre vespas                                                                          
as lunetas estão sangrando juros
um atlas só de rostos me envolve feito âncora
sabor cru e indomável de vida afunda vida afunda vida afoga
     olho já sem filme
     osso já sem firme
retorcidas possibilidades evaporadas num aquário
    blues suspenso da extinção
     estiagem a dois resgatada em sua sede
     cessem os monstros assassinos páginas de números    
     hospícios hospitaleiros balas anestésicos         
                                                                                                                                                                                                    quero a euforia turva dos contrastes deslumbrantes
as ostensivas horas da tempestade feito whisky
numa sacada de primavera tingida em chagas


FUTURO EM FÚRIA


todos os eletrônicos sagrados ruíram com cócegas
têmporas lapidadas se derreteram em química miragem

viveram pólvoras por detalhes
retalho pelo retalho em amarga voz

semblante animal lívido próximo à porta
sonegávamos entreabertos as sirenes do teatro lógico

o dia mastigado no bolso anterior
cada entulho vespertino em sua espécie ávida
vapores e capacetes abandonados no esgoto

éramos dois esqueletos momentâneos do destino
numa carne viva e suntuosa
esperando esperança


PLAYGROUND


o que mais me relevava naquele
playground vazio
era o silêncio
igual ao meu

infância fantasia atravessada
merthiolates colos contrastes
amigos imaginários
todos eles filhos únicos

ensimesmado
pressentia sons de macondo

outras partes longas
indefinidas
longe do baile de minotauros


ESTADIA


sempre na sua casa
os vitrais se entrelaçam
as teias desnudam o tempo

as peles se dissolvem
meu alicerce mais valente
assiste o horário