“Um Comboio para a Lapónia”

151296941_10164856848845094_8551199891955264769_o.jpg

Como um amor antigo
o Sol toca
a barba gelada. 

Silenciosamente
parte o comboio
quase vazio. 

Quem pisará este chão
quando a neve
uma recordação? 

Que respostas procuro
na lareira
que crepita? 

Aproximo as meias de lã
à lareira estrangeira –
quando um abraço? 

Rodeado por silêncio
branco
a noite estende-se.

Enquanto as batatas
cozem
o peixe espera.  

Que palavras dançam
nas chamas
desta lareira? 

Dois livros
meia-dúzia de paus
e uma noite. 

Protegido por madeira
queimando madeira –
nem uma queixa. 

Uma chávena de café
uma lareira
e todas as distâncias. 

Sobre o mesmo galho
corvos e pombos
aproveitam o Sol. 

Na mão nua
derrete
um punhado de neve.

 

Nos olhos do peixe
uma vida inteira
que passa.

 

No fuso de gelo
o brilho inteiro
de uma estrela.

 

Arrefecem as brasas
nunca esquecerei
as chamas.

 

Iluminado pela lareira
brilha na tua pele
o meu esperma.

 

As crianças fazem
o boneco de neve
como se o Inverno interminável.

 

Neva sobre a pegada
brevemente
ninguém passou.

 

O bruxulear
das últimas chamas
numa noite gelada.

 

Não sabes quão longa
será a noite –
aproveita a última chama.

 

Nunca conseguirás
reacender o que ardeu
até às cinzas.

 

Subir a montanha branca
descer a montanha dourada –
anoitece.

 

Amanhece na montanha
encolhido chego-me
à lareira apagada.

 

Preparo-me para descer
a montanha –
começa a nevar.

 

Esta dor nas costelas
ao inspirar
porque estou vivo.

 

Morreu-me
um amigo –
é tudo.

 

Voltei a sonhar
com o meu amigo –
dia de sol.

 

Reflexo na janela
do comboio –
que fiz dos anos?

 

Pyhä, Fevereiro 2021


* Título pela Tatiana Faia