Quelques regrets

Nestas ruas do Poço do Bispo
que, já então, eram feias como agora,
andámos à procura duma loja de instrumentos.
Sonhávamos com música;
a loja, repleta de órgãos partidos e bafientos,
pareceu-nos a caverna de Ali Babá,
preciosa para brincarmos aos conjuntos;
enfim, eu não queria brincar, nem mesmo sonhar,
queria encontrar a música nas coisas palpáveis,
queria ir ter com ela, na vida, e depressa.
Demasiado depressa. Não me acompanhavas.
Ainda nesse Verão, depois dumas horas
a tentar ensinar-te os acordes de “I love her”
disse-te o que ainda hoje dói
e já não se desdiz.
Os prédios, os carros estacionados
ficaram no mesmo sítio,
mas um grande e largo rio
de baba e ranho
correu e separou-nos para sempre.
Dizem que, aqui, o oriente de Lisboa
era lindíssimo antes da indústria.
De olhos fechados, ainda se avista esse lugar ameno,
belo como a tua amizade imerecida.

14/06/2019


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