INFERNO(S)
/“Einziger, ewiger, allgegenwärtiger,
unsichtbarer und unvorstellbarer Gott”
- Schoenberg
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Mutatis mutandis, eis outro homem,
não esperava encontra-lo por aqui, até
há muitas razões para simpatizar com ele:
certo humor desconcertante,
a bagagem psicanalítica e toda a cinefilia,
mais as ganas de fundir high e low
culture, num momento em que, a bem dizer,
essas diferenças já pouco significam,
e muito graças a ele;
aqui está,
não refugiado na floresta,
mas gravado e difundido
na internet:
todo um outro universo,
o mundo mudou, e claro que sabemos mais
do que se sabia outrora; mesmo assim,
«o que acontece primeiro como tragédia
repete-se depois como farsa», disse alguém,
e ele pegou na frase e fez dela título
para um dos seus muitos, muitos, muitos
livros.
Farsa tristonha:
na hora de se comprometer politicamente
cedeu ao humor; proferiu o conselho intolerável:
fez birra de enfant terrible,
disse que votaria num monstro.
Risos.
Aqueles que os deuses querem
perder…
E poderemos invocar, outra vez,
Ignorância? Ele conhecia o seu presente
e, dolorosamente, o passado.
Mas cedeu à piada, ao jogo
do desconcerto; a melhor arma
fez-se veneno, tentação
na roleta vertiginosa, volúpia
da cegueira.
Vítor Teves - “Inferno” (um poema de Pedro Eiras), 2012-2020. [Mutatis mutandis, eis outro homem].