A porta aberta da Ilha

 Quero-te enquanto corrente de vida ininterrompida, corrente de vida contínua, o olhar líquido que abraça, o abraço mais quente, essas pegadas que deixaste ao sair da ilha, ao fechar a porta. Quero-te enquanto porta aberta que tem o mesmo nome que o meu pai, as mesmas pegadas de saída, ali onde poderia ser areia, mesmo que só para escrever no cimento uma pegada fresca, um nome desenhado com uma chave, um coração, sempre um coração entre dois nomes e qualquer data de qualquer século só para nos tornar mais palpáveis - o número da turma, o nome da escola - dizer os amigos imortais seria um pleonasmo desnecessário. Quero-te livre embora ainda queira estar contigo. Imaginei hoje uma voz que me enchesse o coração e quero essa voz sempre contigo. Quero-te enquanto porta aberta, é nosso dever deixá-la sempre aberta e hoje diria como Safo ao sair de uma das suas melhores noites Quem é belo é belo de ver, e basta; mas quem é bom subitamente será belo.

Ele hoje está cheio, bate ainda mais cheio e é impossível apagar: riscar, parcelar ou interromper uma vida. Nem o caminho é a lápis, nem a vida é uma corda ou fio – nada disto se parte a meio - Amo em em ti esses braços que sobem a paisagem, amo nesta luz os teus dentes, boca, olhos: variantes da mesma luz que aceleram o chão, aqui onde caminham os que aquecem, entre Gaia e Porto, as cinco pontes das voltas que demos a uma cidade que se tornou nossa. Quero-te como sopro de vida que ninguém vai fechar e só te posso dar o que ainda não tenho. Imaginei hoje uma voz que me enchesse o coração e quero essa luz sempre contigo: acelera.

Nuno Brito, Porto, 23 de Fevereiro de 2015.