"Cientificamente me pergunto", de Patrizia Cavalli


Todi, 17 de Abril de 1947 ~~ Patrizia Cavalli ~~ Roma, 21 de Junho de 2022



Tradução de João Coles



Cientificamente me pergunto
como foi criado o meu cérebro,
que faço eu com este engano.
Finjo ter alma e pensamentos
para melhor circular entre os outros,
por vezes parece-me mesmo amar
rostos e palavras de pessoas, raras;
sendo tocada gostaria de poder tocar,
mas descubro sempre que todas as minhas emoções
dependem de um temporal que se avizinha.


Io scientificamente mi domando
come è stato creato il mio cervello,
cosa ci faccio io con questo sbaglio.
Fingo di avere anima e pensieri
per circolare melgio in mezzo agli altri,
qualche volta mi sembra anche di amare
facce e parole di persone, rare;
esser toccata vorrei poter toccare,
ma scopro sempre che ogni mia emozione
dipende da un vicino temporale.

3 poemas de Lalla Romano

 
 
 

Tradução: João Coles

No sangue reside um som profundo

Assim soube quando as tuas mãos

tocaram as minhas pela primeira vez

Desde esse dia ouvimos

como que um vento levantando-se

com o mugido de um órgão

até que por fim domados

nos vergou, como maduras espigas, aquele vento



Eu estou em ti

como o amado cheiro do corpo

como o humor do olho

e a doce saliva

Eu estou dentro de ti

da misteriosa maneira

que a vida está dissolvida no sangue

e misturada na respiração




Ninguém pode derrubar-nos da alegria

a nossa alegria subterrânea

como água branda

como veio de rocha

"À minha nação", Pier Paolo Pasolini


 

Pasolini na torre de chia.
Foto de Deborah beer

 


Nem povo árabe, nem povo balcânico, nem povo antigo,

mas nação viva, nação europeia:

que és tu? Terra de recém-nascidos, esfomeados, corruptos,

governantes empregados de latifundiários, prefeitos reaccionários,

advogadinhos besuntados com brilhantina e com pés sujos,

funcionários liberais, canalhas como os tios beatos,

uma caserna, um seminário, uma praia livre, uma confusão!

Milhões de pequeno-burgueses como milhões de porcos

pastam empurrando-se junto aos pequenos prédios ilesos,

entre casas coloniais degradadas já como igrejas

Precisamente por teres existido, já não existes,

precisamente por teres sido consciente, és inconsciente.

E só por seres católica, não podes pensar

que o teu mal é todo o mal: culpa de todos os males.

Afunda-te neste teu belo mar, liberta o mundo.



tradução: João Coles


“Alla mia nazione”, in La religione del mio tempo, Garzanti, Milano


ALLA MIA NAZIONE

Non popolo arabo, non popolo balcanico, non popolo antico,

ma nazione vivente, ma nazione europea:

e cosa sei? Terra di infanti, affamati, corrotti,

governanti impiegati di agrari, prefetti codini,

avvocatucci unti di brillantina e i piedi sporchi,

funzionari liberali carogne come gli zii bigotti,

una caserma, un seminario, una spiaggia libera, un casino!

Milioni di piccoli borghesi come milioni di porci

pascolano sospingendosi sotto gli illesi palazzotti,

tra case coloniali scrostate ormai come chiese.

Proprio perché tu sei esistita, ora non esisti,

proprio perché fosti cosciente, sei incosciente.

E solo perché sei cattolica, non puoi pensare

che il tuo male è tutto il male: colpa di ogni male.

Sprofonda in questo tuo bel mare, libera il mondo.

“Alla mia nazione”, in La religione del mio tempo, Garzanti, Milano

Dois poemas de Antonio Delfini

Tradução: João Coles


Não te conheço
nem vou querer saber quem és
somente um candeeiro
nos dirá
do nosso encontro
um candeeiro que se apagará
um candeeiro que não dará mais luz
um candeeiro que um dia
não nos dirá
mais nada
esquecido
o nosso encontro.


Caluda caluda
que vem aí o poeta
deixemo-lo passar
falem baixo meninas
abram as janelas
com suavidade
Numa cidade
de trinta mil habitantes
em mil novecentos e trinta e dois
ainda há gente
que espera que o poeta
passe
com o seu passo mortiço
Esperam que ele passe
não por respeito
mas porque é tão curioso
ver um poeta
com um casaquinho
apertadinho apertadinho
Mesmo as raparigas
mais modernas
esquecem por um minuto
o alfa romeo...
para ver o poeta
e rir
rir tanto
daquele seu casaquinho
coitadinho
tão pequenino.

In Poesie della fine del mondo, Einaudi


Non ti conosco
non vorrò sapere chi sei
soltanto un lume
ci dirà
il nostro incontro
un lume che si spegnerà
un lume che non farà più luce
un lume che un giorno
non ci dirà
più niente
dimenticato
il nostro incontro.

Zitti zitti
che c’è il poeta
lasciamolo passare
fate piano ragazze
aprite le finestre
con dolcezza
In una città
di trentamila abitanti
nel millenovecentotrentadue
c’è ancora della gente
che aspetta il poeta
passare
col suo passo smorzato
Lo aspettano passare
non per rispetto
ma perché tanto curioso
vedere un poeta
col giacchetto
stretto stretto
Anche le ragazze
più avanzate
scordano per un minuto
l’alfa romeo…
per vedere il poeta
e ridere
ridere tanto
su quel suo giacchettino
poverino
tanto piccolino.

In Poesie della fine del mondo, Einaudi