somos o púlsar das aves/ a rocha linguística/
toda potencia calquera virtualidade/ unha exposición infinita/
un infinito de dor// non cruzamos correspondencias
Chus Pato, Sonora
Caderno 5
/Caderno 5
os pastéis de nata ali não valem uma beata [antologia de 2017]
Enfermaria 6, Lisboa, maio de 2018, 220 pp.
Editado por João Coles, José Pedro Moreira, Paulo Rodrigues Ferreira e Tatiana Faia
Capa de Gustavo Domingues
12€
Autores
Aldovano Barbosa
Carla Diacov
Cassandra Jordão
Cláudio B. Carlos
Daniel Francoy
Dirceu Villa
Ederval Fernandes
Fernando Esteves Pinto
Fernando Machado Silva
Filipe Teles
Francisca Camelo
Guilherme Gontijo Flores
Gustavo Domingues
Ismar Tirelli Neto
J. Carlos Teixeira
João Bosco da Silva
João Coles
João Gabriel Madeira Pontes
José Manuel Teixeira da Silva
José Pedro Moreira
Konstantinos Kavafis
Leonardo Lacerda
Lucas Miyazaki Brancucci
Manuel A. Domingos
Manuel Resende
Marcel Fernandes
Maria Celiza
Mónica França Fragoso
Nilton Santiago
Patrícia Lino
Paulo Rodrigues Ferreira
Pedro Braga Falcão
Pedro Craveiro
Pedro Marques Pinto
Ricardo Domeneck
Ricardo Escudeiro
Samuel Malentacchi Marques
Sandra Santos
Sergio Maciel
Stefano Calgaro
Tatiana Faia
Tiago Andrade
Victor Gonçalves
Victor Prado
Violeta Parra
Virna Teixeira
Vítor Teves
Yasmin Nigri
Tudo isto para dizer que o Caderno 5 da Enfermaria 6 é uma antologia dos textos que mais agradaram ao quinteto editorial da Enfermaria publicados no site durante 2017. Que o objectivo deste caderno talvez seja agarrar e perder, e não lamentar perder, essa coisa fugidia implícita na longa corrida de personagens arquetípicas do romance português do século XIX: mais do que deixar uma imagem da literatura a acontecer, ou um cânone lusófono em formação (nunca teríamos a isso pretensão), ou gabarmo-nos de publicar o melhor poeta do nosso bairro, simplesmente queríamos deixar aqui um quadro vivo das coisas que aconteceram na Enfermaria 6 durante um ano, aberto para um impulso de olhar para a frente. Esta é uma recolha de ensaios, poemas, contos, notas, breves apontamentos. A sua função pode bem ser vista como a nossa tentativa de mapear os gestos de alguns autores que, generosamente, connosco, tentaram a sua corrida e tentaram registar o significado de determinados momentos, no seu peso histórico, filosófico, político, poético. No seu peso jogando contra eles ou a favor deles. A favor da beleza do quotidiano, contra o lado reles da burocrática rotina cívica. Enquanto blog, a Enfermaria 6 é actualizada quase diariamente, com textos sobre coisas que ferem e sobre coisas que nos fazem pulsar, de autores maioritariamente oriundos de Portugal e do Brasil. Acreditamos que muitos destes textos merecem um registo menos efémero do que o tempo entre uma actualização e outra do nosso blog. Deixamos aqui então esta nossa proposta de anuário. E comprometemo-nos a tentar voltar para o próximo ano.
"Uma espécie de Editorial", Cassandra Jordão & Victor Gonçalves
Seguiu para a gráfica
/Capa de Gustavo Domingues e StudioPilha
Ícaro
/descamando o quarto
cavo a cova fria da rotina
despertando a águia que habita
a pele dos lençóis
tudo enfim deverá acontecer
o voo incerto atravessa-me o osso
alado: lanço-me ao sol
«você não sabe»
/você não sabe
o que é dobrar
uma primavera
você só entende
de invernos,
de edredons,
camisinhas,
band-aid,
merthiolate,
e seriados
um cavalo atravessa furioso
esse lago
fundo dos teus olhos
galopando, galopando, galopando
você não sabe
o que são anzóis
você não sabe
o que é um cavalo
a saliva escorrendo da tua boca
escorrendo pelo canto esquerdo
dos teus lábios
vermelhos-sangue,
uma isca escapando do anzol
você me chove e chove muito
chove imensa constelação
você não sabe
como molha dentro de mim
como boiam minhas entranhas
e afundam
gravitarei teu corpo marítimo
navegarei tuas paisagens noturnas
cansei de ser um peixe
no lago dos teus olhos
serei um anjo
na primavera das tuas coxas
roendo a geografia tópica
dos teus segredos
de balde em balde
encherei teus olhos
serei teu lago
largo, profundo
serei a primavera que não conhece